Seis anos de Pacto Pela Vida no Nordeste de Amaralina: e daí?
A Região do Nordeste de
Amaralina foi uma das áreas prioritárias para implantação de Bases de Segurança
do programa Pacto Pela Vida. Criado através da Lei nº 12.357 de 2011, o Pacto
Pela Vida é um programa de combate à violência, cuja metodologia, segundo o
Governo do Estado, é inovadora: atuar de forma pactuada com a sociedade e o
poder judiciário no intuito de reduzir os índices de violência, sobretudo os
crimes violentos letais e os crimes contra o patrimônio. Copiando a política de
segurança do eixo Rio- São Paulo, de instalação de Unidades de Polícia
Pacificadoras (UPPs), o programa prevê instalações de Bases Comunitárias de
Segurança Pública (BCS), com o intuito de se aproximar da população e reduzir
os índices de violências em áreas consideradas críticas.
A primeira base instalada no
Nordeste de Amaralina foi em 2011, há seis anos. Ao todo, foram implantadas três
Bases de Segurança na Região, distribuídas entre Santa Cruz, Nordeste e Chapada
do Rio Vermelho. Algum tempo depois das implantações, o Governo divulgou
números positivos sobre a violência em todas as regiões onde foram implantadas
Bases Comunitárias. No entanto, embora os números, que sugerem uma forte queda
da violência na região, o que se vive e se sente, enquanto morador (me refiro
ao cenário do Nordeste), é algo diferente. Além do mais, várias perguntas não foram respondidas.
O programa, além da
instalação de bases, incluía uma série de ações sociais e de requalificação da
infra-estrutura nos bairros participantes do projeto, pelo menos de acordo com
um jornal informativo distribuído à época. Com efeito, lê-se, na lei
instituidora do programa, com vista a paz social, projetos nas seguintes áreas:
“Educação, Trabalho, Emprego, Renda e Esporte, Cultura, Desenvolvimento Social
e Combate à Pobreza, Saúde, Promoção da Igualdade Racial, Políticas para as
Mulheres”, entre outros.
Dentre as obras elencadas na área de
infra-estrutura na Região Nordeste de Amaralina, o programa previa intervenções
de requalificação do fim de linha da Santa Cruz, do Vale das Pedrinhas e do
Nordeste, além de revitalização da Praça da Nova República, região sensível da
Santa Cruz, além de outros pontos.
A
prometida Requalificação da Praça Nova República
No entanto, após seis anos
da inauguração da primeira BCS no Nordeste de Amaralina, não houve qualquer
intervenção de requalificação ou revitalização nestas áreas. Qualquer
transeunte desavisado pode constatá-lo, em uma rápida passada por esses pontos.
As perguntas, que vêm logo à mente, são: o que houve? Onde estão as obras?
Revitalização
do fim de linha da Santa Cruz, umas das intervenções estruturais prometidas pelo Programa
Pacto Pela Vida
Nas áreas sociais, o
programa mantém ações concretas, a bem da verdade, como cursinhos pré-vestibulares
e de formação técnica e eventos. No entanto, a maioria das ações já ocorria no
Centro Social Urbano (CSU), antigo Viva Nordeste, programa independente do
Pacto – muito embora o Pacto seja um programa de união de forças de diversos
órgãos. A Base no CSU ocupou um espaço grande onde, inclusive, eram ofertados
diversos cursos, além de área natural de convivência e interação dos moradores.
Portanto, com o advento da Base, alguns cursos foram extintos, enquanto que
outros permaneceram, um e outro com uma nova roupagem.
Os dados estatísticos sobre
a violência na região, desatualizados, datados de 2014, no site do programa, defendem
uma taxa de queda de 65, 2% no número de ocorrências na região. É possível? O economista Jean-Louis Besson já
havia alertado, em A Ilusão da Estatística, sobre a (in)capacidade dos dados
estatísticos de compreender e interpretar corretamente uma realidade. De acordo
com Besson, além de manipulações reais e presumíveis que podem sofrer os dados,
quanto mais rápido se conclui uma pesquisa estatística, maior seu grau de
ineficácia e imprecisão. E o que sentimos, para além desses números? Em um
mundo regido cada vez mais pela estatística, os dados são usados como armas
políticas, independentemente se eles estão de acordo ou não com a realidade. Os
dados fecham discussão, a evidência do número é inquestionável, é isso e
pronto.
Em minha opinião simplória,
sem base alguma em dados estatísticos, mas se valendo da vivência diária,
enquanto morador nativo da região, o quadro da violência pouco mudou desde a
implantação das Bases. Se houve certa pacificação, antes foi por conta de
fatores estranhos à política de segurança pública do Governo do Estado, que bem
sabemos, nós, moradores. A polícia é, e
sempre foi, um dos principais fatores de violência na região, se não o maior. A
aproximação da polícia e a comunidade, com as bases, mostrou-se ineficaz, se resumindo a encontros esporádicos e segmentados Na
verdade, só mostrou, em veias abertas, o quanto estamos separados – nós e a
polícia - por um histórico de violência em que nós, moradores de periferia,
sempre somos as maiores vítimas.
Anos de política de repressão policial não deu em nada, muito pelo
contrário, é uma política conhecidamente, pela prática, ineficiente e
contraproducente. E as Bases surgem neste contexto, como se percebeu ao longo
desses cinco anos desde a primeira instalação. A resolução
do problema da violência está longe e se afasta todos os dias, aos clarins da
política demagógica do Governo de Estado, com anúncios, na área de segurança
pública, de aquisições de viaturas e de pessoal, com o aumento do efetivo
policial nas ruas, como se, num passe de mágica, fosse ser resolvido o problema
da violência. A despeito dos números, todos os dias se perde dolosamente, na
periferia, centenas de jovens, pais e mães de família, em uma política
sistemática de violência do Estado contra a população periférica e negra do
país. As Bases ou UPPs, por si só, não resolverão nada, como se observou tanto
aqui quanto no Rio e São Paulo. Não se resolvem problemas complexos com fórmulas
ultrapassadas e prontas, tampouco se resolverão de maneira unilateral, em que
as políticas são feitas de cima pra baixo.
Cássio Santana é morador da Santa Cruz e membro do CineMaloca.
Comentários
Postar um comentário